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INDEPENDENTEMENTE DO RESULTADO, A MAIOR ELEIÇÃO DO MUNDO É UMA OPORTUNIDADE PARA O BRASIL

Luís Henrique Pedroso


Já são pouco mais de cem dias desde que Jair Bolsonaro e Ernesto Araújo assumiram, respectivamente, a Presidência e o Ministério das Relações Exteriores. Pouco fizeram, muito falaram. Um governo que deixa a desejar, especialmente em suas relações exteriores. Os atuais líderes precisam, urgentemente, entender melhor o ambiente que estão atuando, seus deveres e obrigações, seus poderes e agir estrategicamente. Em recente post nesse blog, Vera Galante apontou os superficiais resultados das viagens de Bolsonaro a Davos, EUA, Chile e Israel. Neste nosso mundo ultra-interligado, interdependente, repleto de transformações sociais, econômicas e tecnológicas, cem dias podem representar muito tempo, muito dinheiro, muitas oportunidades desperdiçadas. Um alerta: tentemos não perder essa.


Na última semana, no dia 11 de abril de 2019, mais precisamente, a Índia iniciou a maior eleição do mundo. Serão cerca de 900 milhões de eleitores – aproximadamente 10% da população mundial – em mais de 50 distritos eleitorais que votarão para formar o novo Congresso que, por sua vez, indicará o novo Primeiro Ministro (PM). Narendra Modi, atual PM, concorre à reeleição pelo Bharatiya Janata Party (BJP), partido historicamente de direita, e ao que tudo indica deverá batalhar na tentativa de construção de uma megacoalizão para superar seu adversário com sobrenome Gandhi. Formar uma coalizão partidária não é uma tarefa fácil, em um país como a Índia, então, tarefa hercúlea: são mais de 1.800 partidos reconhecidos pela Comissão Eleitoral e mais de 8 mil candidatos. As próximas semanas serão tensas na Índia, especialmente porque não param de surgir relatos de fake news contaminando o processo eleitoral.


O atual momento na Índia não é favorável à reeleição e isso já ficou claro com algumas derrotas sofridas pelo partido do Primeiro Ministro Modi nas eleições regionais. Nem por isso Modi deixou de ser favorito, mas enfrentará mais resistência quando comparamos à 2014. A taxa de desemprego aumentou, os custos de produção agrária aumentaram e os preços das commodities diminuíram, gerando, assim, pressões sociais da grande parcela de camponeses indianos. Economicamente o governo Modi ficou aquém do esperado, especialmente pela população mais pobre. O descaso do governo com os muçulmanos também continua a gerar protestos e tensões nas relações hindu-muçulmanos. Ainda, pesquisas apontam que o aumento da participação das mulheres nas eleições tende a tirar votos do BJP.


No entanto, um acontecimento recente favoreceu a imagem do PM Modi: a retaliação aos ataques paquistaneses na região da Caxemira. Recentes pesquisas mostram que o embate contra um inimigo comum parece ter fortalecido o sentimento de união do povo indiano e destacado a imagem de líder do Primeiro Ministro. Modi soube obter bons ganhos políticos dos ataques aéreos comandados contra possíveis campos de treinamento terroristas. Pautas de segurança internacional em uma Índia avançando tecnologicamente e desenvolvendo sua base industrial de defesa são, em geral, oportunas. As tensões no entorno estratégico indiano mantêm esse assunto sempre em alta: Paquistão, China, Afeganistão e Mar Arábico, por exemplo.


E o Brasil? Por que ficarmos atentos ao processo eleitoral na Índia?


Até 2025 – em seis anos! – é esperado que a Índia ultrapasse a China como país mais populoso do planeta. Até 2030 – pouco mais de uma década! – a Índia deve ser a segunda maior economia do globo. Atualmente cerca de dois terços dos indianos têm menos de 35 anos. As atuais relações comerciais entre Brasil e Índia são muito restritas e, mesmo assim, movimentam boas cifras. De nossa parte, exportamos óleo bruto de petróleo, óleo de soja e açucares de cana, itens que, somados, representaram 60% do total exportado para Índia em 2018. Da parte deles, exportaram para nós fios têxteis de poliéster, inseticidas e querosene de aviação que, somados, não chegaram a 12% do exportado para o Brasil em 2018. Em outras palavras, a pauta de exportações da Índia para o Brasil é mais diversa e nós ainda podemos – devemos! – explorar esse mercado. A expansão na lista de produtos, bens e serviços comercializados entre os dois países tende a aumentar o peso de ambos no cenário internacional. É bem verdade que o BRICS, IBSA, G20 e seus instrumentos tentam ser os fóruns para esse processo, mas até o momento sem muito sucesso. Fortalecer relações bilaterais, uma ótima forma pragmática para não deixar o tuk-tuk passar.


O grande desafio do novo governo indiano é preparar a economia do país para absorver esse crescimento de forma inclusiva e sustentável. Setores como de energia, automobilístico, medicamentos, softwares e espacial surgem como principais candidatos a investimentos e cooperação. Alô Brasil! Segurança cibernética é matéria de especial interesse indiano, com altos investimentos e oportunidades. Alô astronauta! Nos últimos anos os gastos com aquisição de equipamentos e produtos militares por parte do governo indiano superou a barreira dos 100 bilhões de dólares, sendo a índia um dos maiores importadores de armas (em seu sentido mais amplo) do mundo. Alô Azevedo e Silva! E, naturalmente, segurança alimentar é e permanecerá sendo uma das principais preocupações indianas. Produzir mais, em menos tempo, em menor área, com mais eficiência é uma necessidade. Alô Tereza Cristina! Alô Embrapa! Agro é mais, Agro é pop, mas Agro não pode ser tudo.

Seja Modi ou seja Gandhi, o futuro Primeiro Ministro indiano não conseguirá superar sozinho os desafios de sua gigante nação. Um olhar mais atento para além dos seus vizinhos, para além da Ásia, pode ser um caminho interessante no projeto indiano de desenvolvimento. Um país que aumento em quase 15% o total de produtos e bens importados em 2018, ultrapassando o montante de 500 bilhões de dólares, certamente é um parceiro relevante para qualquer nação. Quanto desses mais de 500 bilhões vieram para o Brasil? Menos de 4! Sim, menos de 4 bilhões! Segundo o MDIC, a Índia foi destino, em 2018, de míseros 1,63% das exportações brasileiras. Um alerta: tentemos não perder a oportunidade que nos é dada com as eleições no Brasil e na Índia.


Em poucas linhas é possível entender que há muito a ser explorado nas relações Brasil-Índia e que as eleições gerais podem impactar uma maior aproximação ou afastamento com o novo-velho governo indiano. Mas para isso Bolsonaro e Ernesto Araújo precisam abandonar os twites e discursos de campanha e considerar mais do que as relações bilaterais com EUA e Israel, ou questões de menos importância com o brasão no passaporte ou o fim do horário de verão. É preciso olhar o mundo como ele é, não como gostaríamos que fosse. Dia 23 de maio saberemos o resultado das eleições gerais na Índia. O período de campanha passou e os cem primeiros dias também, uma oportunidade de fortalecer laços com um parceiro estratégico não pode ser perdida, independente de quem venha a vencer por lá.








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